Amanheceu, e mais uma vez Ana se preparara para a mesma
oração de todos os dias.
Toma seu banho, põem sua roupa ainda amarrotada - o
seu ferro de passar havia queimado e o dinheiro do mês não foi o suficiente
para comprar um novo-, toma seu café com leite, e sai correndo para pegar o
ônibus. Mesma manhã rotineira, menos por um detalhe, ela iria ver o Seu Paulo
novamente, e dessa vez, com a certeza de que ela poderia ser Ana, não mais
precisando ser a moça que cuida da casa da Dona Muriel.
No horário de sempre, o ônibus para em seu ponto e Ana
sai correndo a passos largos, afinal, ela queria ser a mais bela, até mesmo entre
as próprias sorveteiras para que Seu Paulo só tivesse olhos para ela. Na pressa
de se enfeitar com cores, Ana pela primeira vez passa batida por suas paisagens
e até quem está passando ao seu lado dá para escutar o pensamento dessa menina
que só pretendia ser feliz.
Chegando ao seu trabalho, a única preocupação de Ana é de
terminar tudo o mais rápido possível para poder comprar uma blusa nova com o
adiantamento dado pela Dona Muriel- e claro pedido pela Ana, que havia dito que
sua pobre e falecida mãezinha estava doente. Coitada!-. É hora do almoço
- Agora sim! É minha vez. –pensou Ana ao se lembrar de
que a hora de ser feliz estava cada vez mais próxima.
Entre uma loja e outra no centro da cidade, Ana se via
vestida em todas as roupas das vitrines. Em uma loja de marca, imaginou-se no
lugar da manequim, e logo fez uma viagem até a Riviera francesa tomando um bom
vinho ao lado do Monsieur Paulo. Em outra loja, viajou para a loucura de Nova
Iorque tomando um café em um pequeno pub junto ao seu grande amor Paulo. Entre
uma e outra vitrine, Paulo mesmo ali não estando, ali estava graças ao
pensamento de Ana que o trazia até ela, seja aqui, ou seja em qualquer parte do
planeta, estando com ele era o que importava para essa sonhadora mulher.
Depois de muito andar, Ana olha para o relógio e vê que o
seu tempo de imaginação estava acabando, e precisaria se apressar caso ainda
desejasse ser a mais bela aos olhos de alguém, ao menos uma vez na vida. Ana
então escolhe um vestido branco com flores rosa, que contrastam com sua pele
alva e cabelos negros. Seus olhos cor de mel, nunca estiveram tão brilhantes
como nesse momento, foi ai que ela pensou:
- É esse! E que o amor me faça graça!
E logo em seguida, em voz alta falou:
- Moça, vou levar esse. Mas... Vocês aceitam cartão de crédito?
Vendo a cara de Ana, a atendente lhe deu um sorriso
forçado e lhe soltou uma piada revestida de gentileza:
- Me perdoe, mas não sei seu nome, mas ca...
- Meu nome é Ana, Ana Rosa na realidade, mas, pode me
chamar só de Ana. – Disse Ana interrompendo inocentemente a vendedora.
- Bom, como estava dizendo dona ANA... caso não tenha
lido na porta de entrada, não trabalhamos com cartões de crédito nem com
cheque. Caso não tenha dinheiro para pagar, melhor procurar um vestido que
caiba em seu bolso.
Ana se sente inferiorizada, mas não derrotada. Ela
lembrou que na carteira havia um dinheiro reservado para pagar um ferro de
passar novo, aqueles modernos com jatos de agua e vapor que ela tanto via na
televisão. Ao lembrar-se disso, saiu em disparada, pegou a carteira, e viu que
ela possuía o dinheiro exato para vestido. Então ela sentou na cadeira, e
olhando para a carteira pensou:
- Poxa, pela primeira vez em minha vida posso ter
encontrado o amor de minha vida e não posso comprar um vestido lindo, pois,
tenho que comprar um ferro de passar... Quer saber? Chega de escolhas, hoje vou
viver. Viver para o amor e ser vivida por ele. Vou comprar esse vestido, o
ferro que espere.
Após isso, Ana se levanta e fala em voz alta:
- Vou levar esse vestido! E olha, vou pagar em dinheiro
tá? Não se preocupa não moça, sou pobre, mas sou honesta.
Com olhar de entojo, a atendente lhe sorri e fala:
- Como quiser dona Ana Rosa.
Ana nem pediu para embrulhar o vestido, já saiu com ele
em seu corpo rindo a toa e cantarolando uma música qualquer de Betânia.
Meia hora se passou e lá estava Ana no lugar marcado, na
hora marcada e com o sorriso de quem tivesse visto os passarinhos da Branca de
Neve. Nesse momento a única coisa que Ana pensou foi se Seu Paulo iria gostar
dela assim, se o vestido estava grande demais, se o cabelo estava bagunçado, se
o bafo tinha passado, se o batom estava borrado, qual frase usar quando ele
chegar, se a voz era feia.... Feminices agudas de uma menina mulher apaixonada.
Passam-se vinte minutos e nada do Seu Paulo aparecer, Ana
então começa a se preocupar, olhar as horas no relógio e ver que seu tempo
estava acabando e que precisava voltar ao trabalho antes que Dona Muriel se
lembre que sua mãe faleceu há 10 anos, e não está nada doente.
- Será que agi errado em ter o chamado para tomar um
sorvete? Porque ele não me procurou para dizer que não poderia vir? Será que
aconteceu algo de grave com seu filho? Meu deus, será que aconteceu algo de grave
com o Seu Paulo?
Todos esses pensamentos se passavam pela mente de Ana e
respectivamente seu olha fixado para o nada dialogava com suas expressões a
cada nova suposição. Depois de mais dez minutos pensando no impossível, a
garçonete chega na mesa de Ana e fala:
- Ana Rosa é você? Tenho um bilhete que Seu Paulo mandou.
Ele pediu para que você lesse e não respondesse.
Ana com cara de preocupada, abre o tal bilhete e
começando a ler, seus olhos enchem de lágrimas, que aos poucos, tomam conta do
seu rosto de forma involuntária.
Autor: Cristian Schröder